15 de abril de 2009

Os subalternos

Definição
É um espécime que se define pela pertença a um Chefe. Todo chefe tem pelo menos um subalterno. Via de regra, são vários, muitos. Alguns chefes chegam a colecionar subalternos em grande quantidade.

O chefe de apenas um subalterno é chamado chefe trainee e geralmente possui o subalterno apenas para descontar as broncas que leva do seu chefe, pois o chefe trainee tem sempre outro chefe. Em outros termos, esse tipo de chefe não passa de um estagiário de chefia. De acordo com o estado físico apresentado pelo seu subalterno, pode ascender a chefe sênior. Se o subalterno ficar aleijado, esquizofrênico ou se vier a falecer, o trainee pode, inclusive, se candidatar a presidente da empresa.

Sentido existencial
Por que o chefe tem subalternos? A resposta é simples: para humilhá-los. O chefe somente se realiza e eleva a sua autoestima quando dá aquela esculhambação nos subalternos. Estes, embora pareça insensato, sentem-se bastante felizes e não reclamam se houver torturas ou descontos em folha. Tranquilos, sabem que a ira do chefe é um bom, um excelente sinal. Só o chefe irado, possesso, o chefe que cospe marimbondos, ama seus subordinados.

Patologias
O subalterno sente o coração pulsar forte quando vê o chefe. Já na sua ausência sente prostração e falta de disposição para qualquer atividade produtiva. Em casos graves, a mão do subalterno, que sempre se amolda perfeitamente ao saco do chefe (nunca esqueça que mesmo os chefes do sexo feminino têm saco, mas não para tolerar suas gracinhas), pode, sem ter o que pegar, se voltar contra o subalterno.

A ausência prolongada do chefe pode levar a quadros clínicos como aquele no qual, entre delírios e alucinações, o subalterno vê o chefe em todos os lugares e, suprema heresia, chama de chefe quem não é chefe. A medicina tem registros de patologias raras, nas quais o subalterno crê ser, ele mesmo, o próprio chefe. São situações de prognóstico nefasto e ganham o nome de Cri du Chef, pois o pobre mortal trata a todos em sua volta com gritos iguais aos que ouve do chefe. Quem acha que já viu de tudo na vida deve ir a um sanatório e procurar por um deles. Mas, vá prevenido. É uma experiência chocante.

Raízes genéticas
De todo modo, é importante para todo subalterno saber que é um privilegiado. Veio a este mundo com a missão de ter um chefe, o que garante uma tranquilíssima vida medíocre e sem culpas. Pesquisas recentes demonstram que é possível isolar o DNA do subalterno, sempre uma cópia imperfeita do código genético do chefe.

Identificação
Comportamentalmente, o subalterno é identificável a olho nu desde a sala de parto. É aquele recém-nascido que bate continência para o médico e despreza a pobre mãe, que será, por toda a vida, tratada apenas como um recipiente no qual sua essência subalterna habitou por nove meses. Mas há os que, nas brincadeiras infantis, demonstram inaudita crueldade e surram frequentemente os mais fracos. Nestes casos, cabe investigar se não houve troca de bebês na maternidade. Você pode estar diante de um chefe nato e hereditário.

Tipos de subalternos
Há os que acreditam haver apenas uma modalidade de subalternos. Ledo engano, pois há várias, das quais destacamos três básicas. Há os subalternos dóceis, os que aceitam ipsis litteris as determinações do chefe. Entre esses, há subdivisões sutis entre os que ainda as elogiam e os que pensam em fazer isso, mas caem em prantos levados pela emoção de receber uma ordem e não conseguem tecer todas as loas que gostariam.

Há os subalternos ambivalentes, que são aqueles que acatam prontamente as decisões do chefe, mas resmungam longe da sua vista. Não o fazem por mal. O que os motiva podem ser más companhias, degenerações de personalidade ou problemas de encosto.

Os recalcitrantes, o terceiro tipo, são uma espécie em extinção. Caçados pelos subalternos normais, os dóceis, são denunciados, julgados e sumariamente executados por justa causa. São, ou eram, aqueles que aceitam, ou aceitavam, as ordens e fazem, faziam, as coisas à sua moda. Sumirão definitivamente do mapa, da mesma forma como aconteceu com os subalternos rebeldes, os que discutiam as ordens do chefe. Estes podem ser encontrados, empalhados, em museus, na seção paleolítica, ao lado dos dinossauros e tigres de dentes de sabre. Dos subalternos violentos, os que se recusavam a cumprir as ordens, só restam ossadas.

Subalternidade cultual
De acordo com os rígidos preceitos religiosos que adotam, os subalternos amam o chefe acima de todas as coisas. Engana-se aquele que acha que esses seres amam o chefe como a si próprios. Amam apenas o chefe e, se este permitir, podem ter até certa simpatia em relação a si próprios. Os mandamentos do subalterno incluem também não cobiçar as secretárias do chefe, nunca pronunciar o nome do chefe se não for para elogiá-lo, não furtar a paciência do chefe e jamais matar tempo jogando paciência ou pondo açúcar no café.

A já citada "hora do esporro" é solene, um momento sacro, comparável a uma canonização. O subalterno sente-se purificado ao ser banhado pela saliva benta do chefe.

Terminologias
Os subalternos têm outros nomes que os identificam. Podem ser chamados de ralé, plebe, rebotalho, bagrinhos, barnabés, rataria, etc. etc.. Em público, com exceção dos sacros momentos da mijada, o chefe nunca os chama assim. Frequentemente os classifica como “colaboradores”. Já na intimidade do lar ou em reuniões com outros chefes, os subalternos são usualmente chamados de “aqueles merdas” ou “os filhos-da-puta”.

O subalterno e a política
Há subalternos que fundam sindicatos. Geralmente, as greves são suspensas no primeiro soco na mesa que o chefe dá e as negociações terminam quando acaba a estabilidade no emprego. São piores que chatos, por isso não é raro acabarem também grudados no saco do chefe. Nesse caso, não há negociações ou greves e tudo segue como deve ser.

Houve, na história humana, aqueles que intentaram sublevar os subalternos. Um deles cunhou a célebre exortação: “subalternos de todo o mundo, uni-vos”. Eles se uniram, mas quando descobriram que iam ter que ser seus próprios chefes, escolheram novos chefes. Estes, mais chefes que os antigos chefes, também se uniram para esfolar os subordinados. E, assim, todos vivem felizes para sempre.
Luiz Geremias

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